Beija-me (2013-15)

 

 

Beija-me. Expressão no imperativo que solicita um gesto de carinho do espectador. Beija-me mostra resquícios de ações artísticas, exibe expansões de performances em diferentes suportes, os quais afirmam duas ideias contrárias: o efêmero e o eterno, ao mesmo tempo que, em tom de pedido (ou de ordem), espera o beijo de consentimento do observador diante de obras que protestam contra as normas vigentes. Beijos em circunstâncias excepcionais assinalam o que pertence à condição de transitório, mas, ao mesmo tempo, convocam o que é inacabável, juram o que é perpétuo. Componentes que associam signos do casamento são retomados com assiduidade nessas concepções da Cia. Excessos, e a realidade e a ficção transitam numa linha tênue, na qual a arte é intrínseca à vida.

Através de fotos e vídeos (obras tangíveis que garantem o registro da performance), os espectadores podem contemplar trabalhos da Cia. Excessos executados no próprio território brasileiro, bem como em Portugal, na Suécia e nos Estados Unidos. A exposição inclui as seguintes obras apresentadas sob forma de vídeo, fotografia e instalação: Beija-se (2012), O Outro Beijo no Asfalto (2009/2011/2012), O Beijo (2006), O Beijo II (2007), Reciprocidade Desalmada (2010/2012/2013) e Romance Violentado (2011). Ao vivo, a performance Aliança (2013) marca o encerramento da exposição. Os resquícios da ação geraram materializações que são expostas através de instalação, fotografia e vídeo.

 

FICHA TÉCNICA

Hilda de Paulo e Tales Frey: Beija-me | Organização e curadoria: Hilda de Paulo e Tales Frey | Identidade Visual: Rubens Rangel | 05 a 13 de março de 2013, Catanduva-SP, Brasil | 16 de janeiro a 06 de março de 2015, Ribeirão Preto-SP, Brasil

 

HISTÓRICO

[2015] Exposição coletiva Beija-me. Organização e curadoria de Hilda de Paulo e Tales Frey. SESC Ribeirão Preto, Ribeirão Preto-SP, Brasil.

[2013] Exposição coletiva Beija-me. Organização e curadoria de Hilda de Paulo e Tales Frey. Estação Cultura, IV Festival de Formas Poéticas, Catanduva-SP, Brasil.

 

Exposição Beija-me (2013), de Hilda de Paulo e Tales Frey. IV Festival de Formas Poéticas, Estação Cultura, Catanduva-SP, Brasil. Fotografias de Ana Paola Frey e Nathália Mello

 

Exposição Beija-me (2013), de Hilda de Paulo e Tales Frey. IV Festival de Formas Poéticas, Estação Cultura, Catanduva-SP, Brasil. Fotografias de Ana Paola Frey e Nathália Mello

 

Hilda de Paulo e Tales Frey, Aliança. Performance realizada em Catanduva-SP, Brasil. Março de 2013. Fotografias de Gustavo Rosa Fontes, Nathália Mello e Paola Frey

 

Hilda de Paulo e Tales Frey, Aliança, 2013. Vídeo, 2’35”

 

Exposição Beija-me (2015), de Hilda de Paulo e Tales Frey. “Amor Diverso”, SESC Ribeirão Preto, Ribeirão Preto-SP, Brasil. Fotografias de Ana Paola Frey

 

Com Amor, É Proposto Guerra à Intolerância

Este texto de Julia Pelison foi publicado em: arte|ref (Cotia-SP, janeiro de 2015).

 

Através de uma arte-política queer engajada, determinada a suscitar o pensamento crítico contra uma relação de poder controlador/disciplinar amparado por uma lógica proporcionada pelos regimes de normalização, a Cia. Excessos apresenta, na unidade do SESC Ribeirão Preto, de janeiro a março de 2015, a exposição Beija-me, que traz uma irônica súplica pelo gesto de carinho como um ato que substitua as tantas pedradas, porradas e “lampadadas” que ainda são, brutalmente, aplicadas contra o ser humano taxado de abjeto em nossa sociedade. A temática insistente (quase obsessiva) explorada em uma série de ações que resultam na exposição funciona como um minucioso estudo antropológico e, sobretudo, social, pois evidencia como cada ambiente especulado reage e lida com uma determinada situação de beijo, sendo que, em todos os casos, o elo entre os lábios expõe uma relação que questiona normas vigentes mesmo quando trata-se de um beijo heterossexual.

Com O Beijo (2006), O Beijo II (2007), O Outro Beijo no Asfalto (2009), Reciprocidade Desalmada (2010), Beija-se (2012), Aliança (2013) e Romance Violentado (2010), a heteronormatividade, a chamada “heterossexualidade compulsória” e o heterossexismo são postos em xeque.

Lidar com a diferença é incomensurável e a Cia. Excessos procura harmonizar a relação entre os subalternizados e os hegemônicos através das situações conflitantes criadas, propondo que enxerguemos nós mesmo no Outro, sugerindo a aceitação de uma perspectiva não normalizadora.

Foi em 2006, depois de um ato de censura por parte do Centro Cultural do Banco do Brasil, ao retirar uma obra de Márcia X. da exposição Erótica: Os Sentidos da Arte, que Tales Frey e Cristine Ágape resolveram se beijar por trinta minutos ininterruptos no foyer do CCBB com seus trajes convencionalmente trocados segundo uma lógica binária e, assim, surgiu a performance O Beijo, que depois foi desdobrada em O Beijo II para, posteriormente, originar a ação O Outro Beijo no Asfalto, que extrapola as barreiras institucionais para consignar a primeira intervenção pública realizada pela companhia e, também, a forte parceria entre Tales Frey e Hilda de Paulo, bem como a oficialização da Cia. Excessos.

Com tais ações, Tales, junto da Cia. Excessos, prova que a sociedade reage com menos tolerância e compreensão com relação ao rompimento das normas ou convenções de gênero do que com relação à orientação sexual em si (MISKOLCI, 2012: 41). Já com Reciprocidade Desalmada e Beija-se, a estratégia é analisar o narcisismo tão presente em nossa atualidade e a nossa incansável relação com o espelho, bem como os tantos elos possíveis: ela e ele, ela e ela, ele e ele, entre outros tantos possíveis elos que rompem os limitadores preceitos já ultrapassados.

Aliança, um ritual de casamento que se inicia numa galeria de arte e termina num cartório, é o desfecho desta série e o timbrar de uma relação que envolve o amor íntegro e uma fundamentada parceria artística que busca perseverar, fixar e persistir como uma tatuagem, tal qual a registrada na body art Romance Violentado, de Hilda de Paulo, que foi coerentemente incorporada à exposição. Beija-me, embora reúna resquícios de eventos inicialmente concebidos para serem vistos ao vivo, transporta o teor despertado na experiência da vivência para uma viva análise documental.

 

BIBLIOGRAFIA

MISKOLCI, Richard. Teoria queer: Um aprendizado pelas diferenças. Belo Horizonte: Autêntica, 2012.